Dados são do Observatório de Saúde na Infância
O Brasil registra por ano 22,9
mil mortes de bebês de até 1 ano que poderiam ser evitadas se houvesse
tratamento para doenças como diarreia. O risco aumenta com a queda da cobertura
vacinal. Os dados são do Observatório de Saúde na Infância (Observa Infância)
que fez uma média dos números registrados entre os anos de 2018 a 2020.
A avaliação indica que duas em
cada três mortes de bebês desta faixa etária poderiam ser evitadas no país com
ações como vacinação, amamentação e acesso à atenção básica de saúde.
A pesquisadora do Observa
Infância Patricia Boccolini lembrou que, em 2019, o Brasil perdeu o selo de
erradicação de sarampo, por causa da queda na cobertura vacinal, inclusive para
outras doenças. “A gente vem observando o aumento no número de casos, muitos
deles evoluem para hospitalização”, disse em entrevista à EBC.
Patricia, que é vinculada ao
Núcleo de Informação, Políticas Públicas e Inclusão (Nippis), informou que, no
período de três anos, foram contabilizadas mais de 1,6 mil internações
decorrentes de sarampo, número que não era registrado desde o início dos anos
2000. Em igual período, foram 26 óbitos de crianças abaixo de 5 anos por causa
da doença. “A gente já estava há anos sem ter uma morte sequer por sarampo no
Brasil”, completou.
O estudo do Observa Infância,
que identifica as causas de mortes evitáveis entre os bebês, utilizou o
cruzamento de grandes bases de dados próprias, do Programa Nacional de
Imunização (PNI) e do Sistema de Informação sobre Mortalidade, ambos do
Ministério da Saúde.
“Nosso trabalho é perguntar a
essas bases aquilo que a sociedade não pode ignorar: o que mata as nossas
crianças? O que podemos fazer para evitar essas mortes?”, destacou Patrícia.
Imunização
O observatório procurou ainda
avaliar a vacinação de crianças abaixo de 5 anos. Segundo a pesquisadora, foram
analisadas informações de cada um dos mais de 5,5 mil municípios brasileiros e
foi possível concluir que há muita desigualdade na cobertura vacinal do país.
“Essa desigualdade está relacionada, principalmente, com o acesso à atenção
básica. Onde a atenção básica não chega, a queda da cobertura vacinal é mais
acentuada”, apontou.
“À medida que a cobertura
vacinal vem caindo nos últimos anos, onde tem uma melhor estrutura de atenção
primária, esse número cai menos, ou seja, como é fundamental a atenção primária
de saúde para manter a cobertura vacinal”, completou o pesquisador do
Laboratório de Informação em Saúde do Instituto de Comunicação e Informação
Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) da Fiocruz, Cristiano
Boccolini, que também participa do estudo.
O pesquisador acrescentou que
mais da metade dos bebês mortos por ano poderiam ter sido salvos por um
pré-natal adequado e uma boa atenção das gestantes no pós-parto. Cristiano
defendeu ainda o fortalecimento de políticas públicas para promover a amamentação
na primeira hora de vida e o aleitamento exclusivo nos seis primeiros meses,
porque há uma relação direta com a prevenção de grande parte dos óbitos
infantis.
“No estudo que eu fui
coordenador, do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil, a gente
observou que 62% das mães conseguem alimentar os seus filhos na primeira hora
de vida em 2019. Isso está aquém dos 80% que a OMS [Organização Mundial de
Saúde] recomenda”, revelou o pesquisador.
Cristiano Boccolini destacou
ainda a questão das propagandas que exaltam fórmulas que substituem o
aleitamento materno.
“A gente tem uns gargalos que
acontecem. Primeiro que tem um consumo excessivo de fórmulas infantis. A gente
tem a indústria convencendo os médicos e as famílias a usarem fórmulas
infantis, ao invés, de amamentarem os seus bebês. Aquelas mães que conseguem
manter o aleitamento, tem um segundo gargalo que é a licença maternidade que
hoje está em quatro meses. As empresas do governo federal e alguns governos
estaduais adotam o conceito de empresa cidadã que estende a licença maternidade
por seis meses, mas a pessoa precisa estar em trabalho formal, o que não é o
caso da maioria das mães”, disse, destacando a importância do fortalecimento da
rede de apoio às mães na atenção primária.
Diarreia e pneumonia
O trabalho indicou também que,
entre 2018 e 2020, o Rio de Janeiro foi o município brasileiro com maior número
absoluto de óbitos (20) por diarreia entre bebês de até 1 ano, seguido de Belém
(19), Manaus (14); e Fortaleza e São Paulo (13). Na mesma faixa etária, a
capital fluminense ficou em segundo lugar (62) entre os municípios com maior
número absoluto de mortes por pneumonia, atrás apenas de São Paulo (99). “Com a
ampliação dessa Atenção Básica à Saúde a gente conseguiria reduzir bastante
essas mortes”, afirmou o pesquisador.
“A gente está na semana de
campanha do sarampo e é importante frisar que os pais levem as crianças para
vacinar. A gente está vindo de anos sucessivos de queda e precisa resgatar. A
campanha é um bom momento para lembrar que quem tomou a primeira dose precisa
tomar a segunda. Quem não tomou nenhuma já toma a primeira. É importante
conscientizar a população neste sentido”, alertou a pesquisadora.
Observa Infância
De acordo com a Fiocruz, o
Observatório de Saúde na Infância “é uma iniciativa de divulgação científica
para levar ao conhecimento da sociedade dados e informações sobre a saúde de
crianças de até 5 anos”. A intenção é ampliar o acesso à informação qualificada
e facilitar a compreensão sobre dados obtidos junto a sistemas de informação
nacionais.
O observatório reúne
pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Centro Universitário
Arthur de Sá Earp Neto (Unifase) da Faculdade de Medicina de Petrópolis, com
recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq) e da Fundação Bill e Melinda Gates.
| Da Agência Brasil
|| Foto: Elza Fiuza