*Por Agatha Cristie
Erra quem entra na polêmica sobre o vídeo publicado ontem, 10, no instagram da TV Câmara em que a vereadora Sheyla Galba (Cidadania) aparece junto com assessores e funcionários da Casa Legislativa dançando, a partir de um viés moralista. Quem acompanha a vereadora sabe que ser uma mulher livre, autêntica, alegre e combativa marca a sua atuação parlamentar e a sua personalidade.
A liberação do corpo da mulher, sua autonomia e o direito de decidir são debates muito caros aos movimentos feministas e, portanto, jamais seremos nós a julgar qualquer mulher por expressar a sua liberdade.
“Se eu não puder dançar, não é a minha revolução”, Emma Goldman.
A questão que saltou aos olhos de muitas pessoas, inclusive profissionais do jornalismo, é a pertinência e a relevância de tal vídeo, e de outros iguais, em um meio de comunicação oficial da TV Câmara Aracaju, uma TV Pública que faz parte de um projeto maior de educação, cidadania e participação da sociedade.
A gente não deveria ter que dizer o óbvio, mas os tempos são esses, então vamos lá afirmar: o uso de redes sociais feito por instituições públicas é diferente do uso por instituições não públicas. É diferente, inclusive, do uso que eu e você fazemos dos nossos perfis nas redes sociais. A comunicação pública não pode ser confundida com a privada.
As pessoas responsáveis pela comunicação pública e institucional devem elevar ao maior grau possível o compromisso com a qualidade e a diversidade de um conteúdo responsável, ético e alternativo. E, nada disso tem a ver com as boas intenções dos profissionais, mas com um debate sério e alinhamento sobre as diretrizes e ética da comunicação pública.
Tudo isso pode não fazer sentido para um público leigo, mas tem muitos pesquisadores e ativistas brasileiros que têm discutido essas questões, pelo menos, desde o processo que levou à criação da TV Brasil e da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em 2007.
Vejo como acertada a tentativa da equipe de comunicação da Câmara Municipal de Aracaju de querer aproximar um público mais jovem da instituição. Mas, a comunicação pública não pode buscar se identificar com o modelo comercial, aprisionada pela lógica, cada vez mais irracional, do like pelo like.
A questão não é a criação de um conteúdo descontraído, mas o tipo de conteúdo que é criado, porque a prioridade das instituições públicas nas mídias sociais digitais deve ser o uso da comunicação pública como uma forma de incentivar a prática da cidadania, é só depois disso que entra o debate sobre formato.
“A política tem sempre uma dimensão estética”, Jacques Rancière.
O vídeo abre uma oportunidade para a direção de comunicação da Câmara pensar todas essas questões. A comunicação pública não é aquela que apenas aproxima o cidadão da esfera pública, mas ela também permite a participação e a interferência do cidadão, seja debatendo, criticando, opinando ou deliberando sobre a ordem social. Além disso, não desistir nunca de tentar acertar e ouvir, ouvir, ouvir deve fazer parte de um exercício democrático de quem está à frente de instituições públicas.
À Sheyla, desejo que continue derramando “o leite mau na cara dos caretas”.
**Agatha Cristie é jornalista, mestranda em Comunicação PPGCOM/UFS, e militante feminista.
||Fotos: 1 - César de Oliveira/CMA/ 2 - Arquivo pessoal
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