Uso de banheiros de acordo com gênero gera discussão entre deputado e movimentos sociais

Proposta do deputado Capitão Samuel foi recebida como "excludente e preconceituosa" por representantes LGBTQIAP+

Na manhã desta sexta-feira, 20, representantes de movimentos sociais discutiram com o deputado estadual, Capitão Samuel (PP), por conta de uma audiência pública, realizada na Assembleia Legislativa de Sergipe (Alese), que visa debater um projeto de lei para proibir o uso de banheiros públicos de acordo com o gênero das pessoas. A discussão ocorreu antes do início da audiência, ainda na entrada da Assembleia. 


"Existem coisas mais importantes do que debater esse tipo de assunto", disparou a representante do coletivo 'Mães pela Diversidade', Alessandra Tavares. "Quando se expõe as famílias LGBTQIAP+, a gente precisa enfrentar isso. Os índices de homicídio e suicídio desta população tem crescido a cada dia e esse tipo de discussão proposta pelo deputado leva ao aumento disso, porque as pessoas estão sendo discriminadas. A gente não consegue entender qual a preocupação de uma criança usar um banheiro. O que o deputado acha que as crianças fazem no banheiro?", questionou.


"Isso está direcionado às pessoas LGBTQIAP+ e isso tem um tom religioso. Sempre de trazer 'Deus' para essa história. Mas Deus é amor e não faz distinção de ninguém. Então está havendo uma distorção do deputado", acrescenta.



A presidente da Associação de Travestis Unidas na Luta pela Cidadania (Unidas), Jéssica Taylor, acredita que "essa proposta é muito complicada e traz constrangimento, principalmente para a população trans e travesti. Tanta coisa que devemos nos preocupar, e ele mesmo, como deputado, que sabemos do índice de mortes de pessoas trans e travestis, especialmente as pessoas negras. Muitas pessoas passando fome e necessidades e ele preocupado com banheiro? É constrangedor e delicado, porque temos outras questões mais urgentes e necessárias para resolver aqui  em Sergipe", pontuou.


A referência estadual para população LGBTQIA+, da Secretaria de Estado da Inclusão e Assistência Social (Seias), Adriana Lohanna, relembrou um episódio sofrido, quando ainda era estudante de graduação. À época, a mestre em educação e militante transfeminista, precisou recorrer à Justiça para ter o direito de utilizar o banheiro feminino. "Estou aqui como uma mulher trans. Como alguém que já viveu na pele esse tipo de segregação que discutem nessa audiência. Eu saía de casa às 17h e só voltava 23h30, porque morava no interior, e ficava durante todo esse período sem poder utilizar o banheiro. Imaginem vocês passarem por essa situação? Naquela época, contava com a boa vontade de uma senhora, que morava vizinha à universidade, para usar o banheiro. Esse processo que estamos vivendo aqui é necessário para ouvir o que nós, pessoas trans, passamos. Hoje discutimos algo que já está pautado e bem sucedido e é muito necessário que, pessoas como eu, tenham espaço para voz, porque essa audiência não poderia acontecer sem ouvir as pessoas que passam por essa situação", disse, ironizando o fato de ter sido chamada à mesa somente após o início da discussão.


De igual modo, o delegado Mario Leony questionou a realização de uma audiência pública sobre o assunto. "Em pleno século 21, com tanto assunto mais relevante para se preocupar, como a redução da violência e criminalidade em nosso estado, ele querendo pautar esse tipo de argumento. Vamos reivindicar os direitos da população LGBTQIAR+. O nosso STF já reconheceu a livre expressão da identidade de gênero, os corpos e corpas dessas pessoas. Não tem o que discutir", assegurou.



O deputado estadual João Marcelo (PT), por sua vez, considerou a questão como "as opiniões podem ser respeitadas, mas o mais importante é respeitar a essência das pessoas". "No momento em que se traz uma discussão como essa para a Casa, no sentido proibitivo, está antecipando algo de uma maneira desnecessária. Quando se traz esse tipo de discussão, somos contrários, porque imputa na essência das pessoas, do ser humano. E o ser humano não pode ser sexualizado. Isso não é um problema da essência das pessoas, mas, sim, de quem sexualiza. Estamos debatendo isso para coibir o preconceito para que todos, em sociedade, sintam-se acolhidos e iguais", disse.


"Qualquer discussão neste sentido é preconceituosa e discriminatória. A sociedade só deve seguir com igualdade e sem discriminação. Qualquer discussão diferente disso, é preconceituosa", complementou.


Em sua defesa, Capitão Samuel justifica que é preciso ter uma regulamentação sobre o assunto. "Nessa discussão buscamos trazer uma legislação para que todos os entes sociais sigam. O que não se pode é permitir que uma empresa privada decida sem regulamentação. Considero o assunto relevante, porque as leis entram na individualidade das pessoas. Esse tema, embora espinhoso, precisa ser discutido porque já existem, fora do estado de Sergipe, o movimento de que esses banheiros sejam uma realidade em todos os lugares", relatou.


A proposta
O assunto ganhou repercussão quando, no último dia 11, o parlamentar se posicionou de modo contrário sobre a prática de separação de banheiros por identidade de gênero em escolas e universidades. Em pronunciamento na Alese, o deputado se mostrou preocupado com " a separação de banheiros masculinos e femininos conforme a identificação de gênero da pessoa, não de seu sexo biológico" e, por essa razão, apresentou um projeto de lei para coibir esse tipo de definição em Sergipe.


“O meu intuito em ter protocolado um PL contra essa ação se dá pelo fato de termos um assunto muito sério e deve ser discutido no parlamento a nível estadual e federal, pois imaginem essa prática em instituições públicas com adolescentes lidando com isso. Não tenho nada contra existir banheiros femininos, masculinos e um outro nessa questão de gênero. O assunto é muito complexo para ser tratado da forma como vem sendo feito e não podemos relativizar temas como este e irei enfrentar essa discussão. Peço que o PL seja tramitado nesta Casa baseado na proibição desse tipo de banheiro no Estado de Sergipe, especialmente em Escolas Públicas. Não tenho dúvidas que reproduzir essa atitude da Ufes irá causar uma série de problemas”, disse, à época, em pronunciamento oficial.


|Da Redação
||Fotos: Equipe De Hoje




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